Cidade Inteligente ou Exclusão Digital Disfarçada

Cidade Inteligente ou Exclusão Digital Disfarçada?

Tecnologia Só Vale Quando Inclui, Humaniza e Preserva

certificado cidades inteligentes

Durante minha palestra na 1ª Conferência Municipal de Caraguatatuba, lancei uma provocação: “Existe cidade inteligente sem engajamento da população?”. A pergunta não é retórica — é um alerta. Hoje, cidades recebem selos de “inteligentes” por investirem em sensores, câmeras e apps, mas quantas dessas tecnologias realmente melhoram a vida do idoso que não consegue marcar uma consulta online? Da mãe solo que depende do ônibus atrasado? Do cadeirante que não acha informações acessíveis no site da prefeitura?

A verdade é que tecnologia, sozinha, não transforma nada. Ela só se torna inteligente quando serve a todos, reduz desigualdades e não sacrifica o planeta no altar do progresso.

O Mito da Cidade 100% Digital (e Quem Fica Para Trás)

Segundo o IBGE, mais de 20 milhões de brasileiros moram em casas sem acesso à internet — e a maioria é idosa, de baixa renda ou moradora de zonas rurais. Enquanto isso, prefeituras gastam milhões em “plataformas digitais” que apenas aprofundam o abismo social. Exemplos:

  • Apps de mobilidade que não funcionam sem 4G (enquanto o sinal é precário em bairros periféricos).

  • Atendimentos por chatbot que frustram quem não domina linguagem técnica.

  • Sistemas de monitoramento usados para vigiar, mas não para prevenir enchentes em áreas vulneráveis.

Uma cidade não é inteligente se seu cadeirante precisa ligar para a prefeitura 5 vezes para denunciar uma calçada esburacada

O Lado Sujo da Tecnologia: Lixo Eletrônico e Energia Suja

A ONU alerta: o lixo eletrônico é o resíduo que mais cresce no mundo (53,6 milhões de toneladas em 2023). E pior: 75% da energia que alimenta data centers globais ainda vem de fontes não renováveis. Ou seja:

  • A cada sensor instalado, um custo ambiental.

  • A cada novo data center, um rastro de carbono.

Pergunta que não quer calar: Como as cidades podem adotar tecnologia sem replicar esse modelo insustentável?

Soluções reais:

  • Leis de descarte consciente (pontos de coleta de lixo eletrônico em escolas e praças).

  • Energia limpa em equipamentos públicos (painéis solares em postes de monitoramento).

  • Tecnologia de baixo consumo (ex.: LoRaWAN para sensores que gastam menos energia).

*** LoRaWAN: é como uma rede sem fio de longo alcance que usa pouca energia para conectar dispositivos como sensores, tornando-os ideais para monitoramento em áreas remotas ou com poucos recursos.

Inclusão Digital Não É Opção — É Direito

Cidade inteligente de verdade é aquela onde:
✅ O analfabeto digital consegue agendar uma consulta no SUS em 2 minutos (com ajuda de um totem touchscreen e voz guiada).
✅ O catador de recicláveis recebe notificações no celular sobre coleta seletiva.
✅ O deficiente visual navega no site da prefeitura com leitor de tela.

Conclusão: Por Um Futuro Inteligente (de Verdade)

Não basta ter semáforos com IA se o pedestre idoso não consegue atravessar a rua a tempo. Não adianta investir em Wi-Fi grátis se a mãe solo não tem tempo para acessar cursos online.

Cidades inteligentes só existem quando:
🔹 Tecnologia é ferramenta, não fim.
🔹 Sustentabilidade é pré-requisito, não marketing.
🔹 Ninguém é deixado para trás.

Caraguatatuba tem a chance de ser exemplo não pelo “futurismo”, mas pela capacidade de usar inovação para cuidar de gente. E isso, sim, é inteligência coletiva.

Chamada para Ação:

  • Prefeitura: Crie um Conselho de Inclusão Digital com moradores de todas as idades e classes.

  • Cidadãos: Cobrem projetos com impacto mensurável (ex.: “Reduzir filas em postos de saúde em 50% até 2026”).

  • Empresas: Invistam em tecnologia low-carbon e capacitação comunitária.

📢 Não é sobre apps e sensores. É sobre GENTE.

Oswaldo Lirolla
CEO do Projeto EcoAprender